Passei quase o dia todo na rua.
Cinco mandados de prisão para cumprir.
Alguns deles com mandado de busca e apreensão
Sobrou pouco tempo pra outras tarefas.
Mas mesmo assim ainda encontrei tempo para realizar uma
oitiva, uma condução de presos, uma abordagem a indivíduos suspeitos para
identificação e revista e ainda registrar ocorrência informando uma das
prisões.
Dos cinco mandados, quatro prisões.
E algumas apreensões.
Logo no segundo mandado me deparo com uma casa com trêscrianças.
Uma menina muito esperta de uns três anos, um menino de um
ano mais ou menos e outro menino envergonhado de uns quatro anos.
Fiquei do lado de fora da residência enquanto os colegas
cumpriam o mandado.
A menina ria, envergonhada e curiosa com a nossa presença.
Logo, os colegas alcançaram uma faca e eu fiquei segurando.
“Vai levar essa faca?”, perguntou ela.
“Vou levar sim, depois eu devolvo”, respondi.
“E tu vai prender meu pai?”, continuou a menina.
“Não”, respondi novamente, sabendo que não poderia cumprir
com o combinado.
Ela continuou brincando e logo largou mais uma:
“Tu é polícia?”
“Sim”, respondi.
Não me surpreendi que ela tivesse dúvidas, já que muitas
pessoas maiores que ela me perguntam a mesma coisa.
Talvez pelo porte físico, talvez pela cara de guri.
Seja o que for, ainda causa dúvida nas pessoas a minha
condição de policial.
Ele estava colaborando, então, combinamos de não algemá-lo
na frente das crianças.
Mesmo assim, quando elas entenderam que o pai seria preso,
um choro apagou os sorrisos e cortou a alma de quem estava no lugar.
É preciso ser muito insensível pra não sentir absolutamente
nada em um momento desses.
Mas faz parte.
É preciso estar habituado a isso e não deixar que isso
interfira no trabalho.
Logo depois, mais mandados deveriam ser cumpridos e a cabeça
deve estar somente no que se está fazendo.
Não podemos nos dar ao luxo de ficar pensando em determinados
problemas pessoais, que dirá dos outros.
Uma colega nova contou-me a difícil missão de conversar com
uma criança vítima de abuso pelo padrasto.Sentia um aperto no peito e desejava apenas que o relato acabasse logo.
Como se quisesse que aquilo que estava sendo contado fosse
mentira.
Depois de tudo, sentia como se tivesse tomado uma surra,
ante toda a tensão do momento.
Havia tempo que não trabalhava em um ambiente com crianças.
Estava me tornando, de certa forma, frio.
Agindo de forma técnica e mecânica.
Pelo menos, esses choques nos trazem de volta à realidade.
Ótimos relatos. Parabéns.
ResponderExcluirdeve ser dificil mesmo. força cara, e continue fazendo as coisas certas
ResponderExcluirParabéns pelo relato colega, me identifiquei. Tb sou policial civil no interior do Rio Grande do Sul, e criei a pouco um BLog: http://ideiasdeumpolicia.blogspot.com.br.
ResponderExcluirQualquer coisa que precisar prende o grito. Forte Abraço!
Relato incrível, parabéns pelo blog, escrevo pouco mas estou sempre lendo, em breve com fé em Deus estarei na PCCE e a PCBA abriu concurso, estou papirando feito loucorsrsrs vlw...
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